Descrição


Em 1708

  • No Bispado da Guarda, tres legoas desta Cidade para o Poente, em lugar alto na Serra da Estrella;
  • entre fecundas vinhas, vistosos olivaes, & apraziveis hortas tem seu assento a nobre Villa de Celorico, abundante de paõ, caça, gado , & regalado peixe do rio Mondego, que lhe fica perto,
  • sobre o qual atravessaõ tres pontes, huma de pedra, (sumptuosa fabrica delRey D.Manoel) & duas de madeira,
  • tem 400 vizinhos com muita nobreza, divididos por tres Freguesias, a saber, S. Maria, Igreja Collegiada cõ 177 visinhos, que rende duzentos mil reis, S. Pedro com 130 que rende o mesmo & S. Martinho com 91 que rende setecentos mil reis, todas tres Priorados do Padroado Real. Na Collegiada de S. Maria há quatro Beneficios simplices, que apresenta a Sè Apostolica.
  • Tem mais Casa de Misericordia, bom Hospital, & doze Ermidas:
  • he terra deliciosa, & muito amena, com oito fontes perenes.
  • Foy fundada por Brigo IV. Rey de Espanha, 1890 annos antes da vinda de Christo, chamandolhe Celiobriga, movido do seu clima, & fertilidade da terra, de que faz jà mençao Plinio liv. 3. cap. 3. entre as Cidades, que reconheciao sogeiçaõ à de Braga. Depois le denominou Corrorico, corrupto do primeiro. Rodrigo Mendez Sylva lhe chama Zelorico, alludindo à fidelidade, que em diversas occasioens mostràrao seus naturaes:
  • tem por Armas em huma parte do escudo sobre hum Castello huma Aguia, voando com huma truta agarrada nas unhas, (que tomou no cerco, que o Infante D. Affonso Conde de Bolonha poz a esta Villa, por se nao querer entregar Fernao Rodrigues Pacheco, Alcayde mór de seu inexpugnavel Castello, adornado de duas magestosas torres & outros tantos cubelos, por haver feito delle omenagem a ElRey D. Sancho o Segundo, que por remisso no governo foy admittido por Regente do Reyno o dito Conde de Bolonha seu irmao à instancia dos Portuguezes, intervindo nisto a authoridade Pontificia & na outra huma meya Lua & cinco Estrellas, tomadas de outro successo nao menos maravilhoso, allumiando a Lua, sendo nova, emquanto conseguirao victoria dos Leonezes & Caftelhanos no anno de 1187 sendo Alçaydes mòres deste Castello D. Gonçalo & D. Rodrigo Mendes, filhos do Conde D. Mendo.
  • Forao senhores desta Villa Martim Vasques da Cunha, progenitor de illustres Casas, à quem succedèrao outros de igual nobreza, atè que vagou para a Coroa. Depois ElRey Dom Fernando a deo em dote a sua filha D. Isabel, casandoa no anno de 1373 com D. Affonso Henriques, Conde de Gijon, filho illegitimo del Rey Dom Henrique o Segundo de Castella. Finalmente ElRey D. Manoel fez merce della a D. Diogo da Sylva seu Ayo, & primeiro Conde de Portalegre, em cuja Casa andou, atè q por morte de D. Joao da Sylva, Marquez de Gouvea, vagou para a Coroa.
  • Hoje he seu Alcayde mór Andrè Lopes de Lavre por merce del Rey D. Pedro o Segundo, fidalgo da Casa de Sua Magestade, Secretario do Conselho Ultramarino, Comendador da Comenda de S. Margarida da Mata na Ordem de Christo & senhor do Reguengo da Carvoeira & dos lugares de Valbom, Balea, Fonte Boa & Carvoeira, com outros lugares;
  • He o termo desta Villa muy dilatado, & tem trinta & sete lugares, que se dividem pelas Freguesias seguintes.
    • Velloza, Priorado, que apresenta o Conde de Atouguia, tem 70 vizinhos.
    • Porco, Priorado, que foy do Marquez de Gouvea & hoje he do Padroado Real, rende quatrocentos mil reis, tem 130 vivinhos.
    • Cabadoude, Priorado, que rende duzentos & cincoenta mil reis, foy do Conde de Alva em Castella, & hoje he da apresentação de Antonio de Miranda Henriques, senhor do Carapito, tem 110 vizinhos.
    • S. Domingos de Villa Cortès, Priorado, que rende cento  & setenta mil reis , foy do Marquez de Gouvea, & hoje he do Padroado Real, tem 67 vizinhos.
    • Rapa, Priorado do Padroado Rea , que foy tambem do dito Marquez, tem 100 vizinhos.
    • Minhocal, Priorado da collaçaõ ordinaria, tem 80 vizinhos.
    • Vide de Entre as Vinhas, Priorado da collaçao ordinaria, tem 70 vizinhos.
    • Cortiçó, Vigayraria, que apresenta o Commendador de Malta da Villa de Oliveira do Hospital, tem 130 vizinhos com os lugares de Porteira, & Mourella.
    • Jejua, Vigayraria , que apresenta o Comendador Henrique de Carvalho, tem 80 vizinhos.
    • Val de Azares, Curado, que apresenta o Prior de S. Maria de Cellorico com os Beneficiados, tem 212 vizinhos.
    • Lagiósa, Curado, que apresentam os Priores de S. Maria, & de S. Martinho alternatim da dita Villa de Celorico, tem 140 vizinhos.
    • Ratoeira, Curado , que apresentam alternatim os Priores de S. Maria, & S. Martinho da dita Villa de Celorico , tem 112 vizinhos.
    • Casas do Rio, Curado, que apresentam alternatim os ditos Priores de S. Maria, & S. Martinho da Villa de Celorico, tem 60 vizinhos.
    • Cadafás, Curado annexo à Igreja de S. Martinho de Celorico  que apresenta o Prior, tem 96 vizinhos com o lugar de Soutomoninho,
    • Aldea da Serra, Curado annexo à Igreja de S. Pedro de Celorico, que apresenta o Prior, tem 30 vizinhos.
    • Maçal do Chão, Curado de Malta, que apresenta o Comendador de Oliveira do Hospital, tem 115 vizinhos.
    • Soveral da Serra, Curado, que apresentam os Frades Jeronymos do Convento de S. Marcos de Coimbra, tem 140 vizinhos com o lugar do Porto da Carne. 

in Corografia Portuguesa


Em 1860

  • Na província da Beira, junto à serra da Estrella, e três léguas ao ocidente da cidade da Guarda,  situa-se a antiquissima villa de Celorico em  logar alto.
  • Da sua fundação não há notícia certa, pois se  deve ter por fabuloso a que lhe atribuíram alguns  dos nossos antiquarios, que tomaram a palavra  brigo , em que terminavam os nomes das cidades an interiores ou do tempo da dominação romana, pelo  nome de um certo rei de Hespanha, atribuído  a épocas desconhecidas, ou de que há apenas mui confusas notícias. Como Celorico se chamou em antigas eras Ce liobriga, tiraram d'aqui argumento os escriptores  a que nos referimos, para lhe darem pelo fundador  Brigo, rei de Hespanha, que dizem reinara no ano  de 1890 antes do nascimento de Christo . Muitas  razões, porém, levam a acreditar, que essa palavra brigo  designava na língua dos antigos lusitanos cidade  ou povoação; como nos primeiros tempos da mo narchia portugueza se dava o nome de burgo ás  povoações, que se iam levantando junto dos cas tellos, ou dos mosteiros   nome que depois se aplicou aos arrabaldes das cidades e villas . Partindo pois de epocas mais conhecidos na historia , diremos que a terra de que nos ocupamos  já existiu sob o dominio dos romanos, chame-se  então Celiobriga.
  •  Nas invasões que a Lusitania padeceu, quando  acabou aquelle dominio, Celiobriga foi a seu turno  destruida e reedificada. N'estas diversas transformaram-se parece que se corrompeu o seu nome, vindo do ser denominado Corrorico . 
  • Passado apenas meio seculo depois que D. Af fonso Henriques fundara nos terrenos de Campo de Ourique a monarquia portuguesa, veiu um execito de castelhanos e leonezes pôr cêrco ao seu castelo, no ano de 1187. D. Gonçalo, e D. Rodrigues Mendes , filhos do conde D. Mendo, que eram alcaides-móres d'este castelo por el-rei D. perado ataque, e pela claridade da lua, que apesar de ser nova, elas alumiaram o suficiente o campo  venceram e  desbarataram  completamente os  inimigos  Por esta ação tomaram por brasão de  armas o castelo e a villa um escudo com uma meia  lua e cinco estrelas.
  • Pelos annos de 1245, tendo sido deposto do throno el - rei D. Sancho II , e sendo chamado ao governo do reino, com o titulo de governador ou regente, seu irmão o infante D. Affonso, que era conde de Bolonha pelo seu casamento, com D. Mathilde, condessa soberana d'aquelle estado, veiu este principe cercar o castello de Celorico, porque o seu alcaide-mór D. Fernando Rodrigues Pacheco, que o tinha por D. Sancho II, o não queria entregar. Durou o cêrco muitos mezes, e , estando o castello para se render pela fome, foi salvo por astucia de D. Fernando, e por meio de uma truta, que uma aguia deixou cair sobre o mesmo castello . Este successo , que tencionamos relatar com mais miudeza n'outra occasião, foi causa de que se accrescentasse ao brasão d'armas um castello tendo por cima uma aguia com uma truta nas garras.
  • Querem alguns autores, que do zelo com que foi  defendido este castelo n'estes dois cêrcos, se principiou a denominar a terra Zelo Rico, de que se derivou por corrupção o de Celorico.
  • El-rei D. Manuel deu-lhe foral de villa, acrescentando-lhe os privilégios, que lhe havia dado D. Affonso II.
  •  Na curta guerra, que houve entre Portugal e Hespanha, reinando el-rei D. José, foi tomada a villa de Celorico pelos hespanhoes em 1762.
  • O senhorio d'esta terra andou em diversas famílias. Antes do reinado de D. Fernando pertenceu a Martim Vasques da Cunha. Este soberano deu-a em dote a sua filha bastarda D. Isabel, que casou em 1373 com o conde de Gijon, filho natural de D. Henrique II de Castella. El-rei D. Manuel fez merce  d'este senhorio ao primeiro conde de Portalegre,  e vagando para a corôa pela extinção d'esta familia, deu-o D. Pedro  II a André Lopes de Lavre.
  • A villa de Celorico tem três freguesias, intituladas Santa Maria, que é colegiada, S. Martinho e S. PedroO templo da segunda é de fabricação muito  antiga. Foi fundado pelos templarios no ano de  1302. O de S. Pedro tem a mesma origem, .com a  diferença de alguns poucos anos de menos.
  • A casa e hospital da misericórdia foram instituídos no reinado de D. João III, n'uma egreja que já existia, e fora por muitos anos freguesia, com a invocação de Santo André.
  • Na villa e nos subúrbios há nove ermidas, e umas oito fontes.
  • Os arrabaldes de Celorico possuem alguns sítios  de muita beleza e amenidade. O Mondego fertilisa os seus campos, e fornece algum peixe. 
  • O termo produz cereais, leguminosas, fructas, azeite, e algum vinho; e cria-se n'elle bastante gado e caça.
  • Celorico tem uns mil e setecentos habitantes.

em  As cidades vilas da monarquia portuguesa - vol I